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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Uma História... A nossa bicicleta


Ninguém imagina o que eu e o meu irmão Adriano tivemos que “lutar”, chorar e chatear o meu pai para que ele nos desse uma bicicleta. Foram meses e meses de luta constante, de chantagem emocional e de birras à mesa em troca de não sei quantos berros, bofetadas e castigos. Certo dia eis que cansado de mil batalhas, o Zé Maria resolve dizer sim... Que alegria...o coração parecia não caber dentro do peito. A minha mãe aflita como só ela e a tia Rosa do Maneca retorquiu logo :” arranjaste a bonita vais ser para andarem por aí nas estradas a consumirem-me a cabeça...”.Nós , com medo que o meu pai voltasse a trás na decisão fizemos logo ali uma promessa ...Ó mãe nós só andamos nos montes e quando você deixar...
Nessa noite eu e o meu irmão mal conseguimos dormir de tanto pensar na bicicleta prometida. Porém os dias iam passando e não havia forma do sonho se tornar realidade. Até que no dia 18 de Fevereiro desse ano, aniversário do meu irmão o meu pai chega a casa com uma bicicleta de corrida, cinzenta metalizada roda 24. Qual bolo qual carapuça, nem parabéns nem nada, foi todo o dia a dar ao pedal no espaço de 100 m, para a frente e para trás à vez com a tia Elsa a vigiar, não fosse o diabo tecê-las. A minha irmã ficou triste e tinha razão, afinal ela também era filha mas, naquele tempo as raparigas não andavam de bicicleta. Só lhe restava esperar pelos seus anos para receber uma boneca.
Devo dizer que nesta altura uma bicicleta para os dois era muito bom pois na nossa aldeia (Ladroeira) com a nossa idade, poucos tinham tal privilégio. Por vezes ambos queria-mos andar ao mesmo tempo pelo que acabava-mos a guerrear, lá tinha a tia Elsa que intervir, muitas vezes apreendendo a bicicleta como castigo. No geral lá fomos conseguindo negociar um com o outro a sua utilização.
Os rapazes da aldeia tinham o costume de se concentrar junta a nossa casa, era ali que se decidia o rumo dos acontecimentos, jogar à bola , “cowboiadas”, jogos sem fronteiras, monopólio, cartas e agora também passeatas de bicicleta pelos montes e vales, visto que a estrada estava proibida sob pena se perder a respectiva. É obvio que o grupo dos ciclistas era muito reduzido, só tinha bicicleta quem as herdara dos pais, dos avós ou irmãos mais velhos, quando estes por força do trabalho precisaram de comprar uma motorizada e não a deixaram à troca. Como a malta era unida cada um levava consigo um outro no “sport”. Eu e meu irmão como se adivinha co-proprietários da mesma bicicleta montava-mos os dois na nossa, trocando de quando em vez a pilotagem. Esta situação manteve-se até ao dia em que montados na mesma bicicleta encontramos o tio Américo, irmão do nosso avô que nos disse: “Ó rapazes isso assim não tem jeito nenhum ainda vos aleijais os dois... quereis uma bicicleta?” Huuum...” quereis ou não?”... nós um pouco tímidos respondemos ...siiiiim....”Pronto venham cá”...Entramos com ele na loja e lá estava ela pendurada, preta travões de alavanca roda 28. Parecia mentira... tantos anos para conseguir uma e um mês depois já tínhamos outra de mão beijada e sem pedir nada a ninguém. Desde esse dia tudo se tornou mais fácil para mim e para o meu irmão, quando nos apetecia andar de bicicleta não era preciso esperar a nossa vez, no entanto há uma coisa que sempre se manteve, a sociedades da nossa primeira bicicleta
Aos fins de semana as passeatas de duas rodas tornavam-se cada vez mais longas e interessantes, a minha mãe via-nos sair para os montes como era sua imposição e convencida que lhe obedecíamos lá ficava mais ou menos descansada. Nós tratantes como todos os moços da nossa idade, dos montes saltava-mos às estradas e percorria-mos quilómetros e quilómetros a pedalar.
como era divertido um grupo de amigos em pelotão, ávidos de aventuras tal qual os nossos heróis “Pequenos Vagabundos” e” os Cinco” à procura sabe-se lá de quê. Chegava-mos a ir à Senhora da Mó – Arouca.... (hoje só de pensar já me sinto cansado...) e as nossas escapadelas ao Rio, (outro local proibido para os manos Marçal)...que saudade... e os campeonatos realizados a ver quem conseguia dar o melhor tombo de bicicleta...que loucura... e as vertiginosas corridas de Santo Adrião à Ladroeira... que adrenalina... e as idas à Mó Real jogar futebol contra os grandalhões, alguns pais de filhos que se zangavam porque os fedelhos que faziam perto de 10 quilómetros a subir ainda tinham força para lhes ganhar...há raça... nada nos cansava ...e a melhor de todas as peripécias, pelo menos a mais engraçada:
A minha mãe mandou-me à Venda do Toninho comprar Broa, arreliado saí de casa a resmungar sozinho ...mas, por que é que tenho de ser eu... porque não vai a Lena ou o Adriano... O China ou melhor o Quim da Tia Rosa Pronta que estava junto ao nosso portão ouviu-me e logo se ofereceu para ir no meu lugar, desde que lhe deixasse levar a bicicleta. Eu aceitei e ele lá foi todo contente... Quando estava-mos almoçar sentimos que a broa estava cheia de terra e areia. A minha mãe ficou furiosa comigo e acertou-me o pêlo sem que eu soubesse o que dizer. Depois do almoço quando pegava na bicicleta, reparei que ela tinha uma roda feita num oito. Fui ter com o China e ele contou-me que a saca da broa se enfiara nos raios, levando-o a um grande trambolhão que resultou num dente partido. Depois para eu não descobrir pôs a broa junto ao portão e a bicicleta na garagem. Lá fiquei com o prejuízo mas não perdi o amigo...
Claro que sobre as bicicletas muito mais teria que contar, basta ter em consideração que não havia um dia que elas não rolassem, porém talvez noutra altura me dê para escrever mais sobre a sua importância na minha infância feliz .... Por agora fico na nostalgia de um passado que já não voltará mais.


Nel Marçal
"memórias de uma Infância feliz"

3 comentários:

  1. Assim como prometi vim visitar o seu blog e de facto é mais uma forma de transmitir-mos o orgulho em sermos Bairristas. Beijinhos Catarina (vermelha)

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  2. Obrigado Catarina... conto contigo para a sua divulgação. Quero que este cantinho sirva de elo de ligação entre todos os que amam Bairros

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  3. Gosto muito das vossas histórias...publiquem mais são divertidas.
    Aluna do CATL do Centro Social de Real

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